Alfândega

Adélia Prado

O que pude oferecer sem mácula foi meu choro por beleza ou cansaço, um dente exraizado, o preconceito favorável a todas as formas do barroco na música e o Rio de Janeiro que visitei uma vez e me deixou suspensa. ‘Não serve’, disseram. E exigiram a língua estrangeira que não aprendi, o registro do meu diploma extraviado no Ministério da Educação, mais taxa sobre vaidade nas formas aparente, inusitada e capciosa — no que estavam certos — porém dá-se que inusitados e capciosos foram seus modos de detectar vaidades. Todas as vezes que eu pedia desculpas diziam: ‘Faz-se de educado e humilde, por presunção’, e oneravam os impostos, sendo que o navio partiu enquanto nos confundíamos. Quando agarrei meu dente e minha viagem ao Rio, pronto a chorar de cansaço, consumaram: ‘Fica o bem de raiz pra pagar a fiança’. Deixei meu dente. Agora só tenho três reféns sem mácula.