Esperanças

Álvares de Azevedo

Se a ilusão de minh'alma foi mentida E, leviana, da árvore da vida, As flores desbotei... Se por sonhos do amor de uma donzela Imolei meu porvir e o ser por ela Em prantos esgotei... Se a alma consumi na dor que mata E banhei de uma lágrima insensata A última esperança, Oh! não me odeies, não! eu te amo ainda, Como dos mares pela noite infinda A estrela da bonança! Como nas folhas do Missal do templo Os mistérios de Deus em ti contemplo E na tu'alma os sinto! Às vezes, delirante, se eu maldigo As esperanças que sonhei contigo, Perdoa-me, que minto! Oh! não me odeies, não! eu te amo ainda, Como do peito a aspiração infinda Que me influi o viver... E como a nuvem de azulado incenso... Como eu amo esse afeto único, imenso Que me fará morrer! Rompeste a alva túnica luzente Que eu doirava por ti de amor demente E aromei de abusões... Deste-me em troco lágrimas aspérrimas... Ah! que morreram a sangrar misérrimas As minhas ilusões! Nos encantos das fadas da ventura Podes dormir ao sol da formosura Sempre bela e feliz! Irmã dos anjos, sonharei contigo: A alma a quem negaste o último abrigo Chora... não te maldiz! Chora e sonha e espera: a negra sina Talvez no céu se apague em purpurina Alvorada de amor... E eu acorde no céu num teu abraço E repouse tremendo em teu regaço Teu pobre sonhador!