Balada do cavalão

Vinicius de Moraes

A tarde morre bem tarde  No morro do Cavalão...  Tem um poder de sossego.  Dentro do meu coração  Quanto sangue derramado!  Balança, rede, balança...  Susana deixou minha alma  Numa grande confusão  Seu berço ficou vazio  No morro do Cavalão:  Pequena estrela da tarde.  Ah, gosto da minha vida  Sangue da minha paixão!  Levou o anjo o outro anjo  Da saudade de seu pai  Susana foi de avião  Com quinze dias de idade  Batendo todos os recordes!  Que tarde que a tarde cai!  Poeta, diz teu anseio  Que o santo te satisfaz:  Queria fazer mais um filho  Queria tanto ser pai!  Voam cardumes de aves  No cristal rosa do ar.  Vontade de ser levado  Pelas correntes do mar  Para um grande mar de sangue!  E a vida passa depressa  No morro do Cavalão  Entre tantas flores, tantas  Flores tontas, parasitas  Parasitas da nação.  Quanta garrafa vazia  Quanto limão pelo chão!  Menina, me diz um verso  Bem cheio de ingratidão?  - Era uma vez um poeta  No morro do Cavalão  Tantas fez que a dor-de-corno  Bateu com ele no chão  Arrastou ele nas pedras  Espremeu seu coração  Que pensa usted que saiu?  Saiu cachaça e limão.  Susana nasceu morena  E é Mello Moraes também:  É minha filha pequena  Tão boa de querer bem!  Oh, Saco de São Francisco  Que eu avisto a cavaleiro  Do morro do Cavalão!  (O Saco de São Francisco  Xavier não chama não  Há de ser sempre de Assis:  São Francisco Xavier  É nome de uma estação)  Onde está minha alegria  Meus amores onde estão?  A casa das mil janelas  É a casa do meu irmão  Lá dentro me esperam elas  Que dormem cedo com medo  Da trinca do Cavalão.  Balança, rede, balança...