Como uma flor incerta

Sophia de Mello Breyner Andresen

I Como uma flor incerta entre os teus dedos Há harmonia dum bailar sem fim, E tens o silêncio indizível dum jardim Invadido de luar e de segredos. II Nas tuas mãos trazias o meu mundo, Para mim dos teus gestos escorriam Estrelas infinitas, mar sem fundo E nos teus olhos os mitos principiam. Em ti eu conheci jardins distantes E disseste-me a vida dos rochedos E juntos penetrámos nos segredos Das vozes dos silêncios dos instantes. III Os teus olhos escorrem como fontes, E em todo o teu ser existe O sonho grave, nítido e triste Duma paisagem de pinhais e montes. Na tua voz as palavras são nocturnas E todas as coisas graves, grandes, taciturnas A ti são semelhantes.