O martírio do artista

Augusto dos Anjos

Arte ingrata! E conquanto, em desalento, A órbita elipsoidal dos olhos lhe arda, Busca exteriorizar o pensamento Que em suas fronetais células guarda! Tarda-lhe a Idéia! A inspiração lhe tarda! E ei-lo a tremer, rasga o papel, violento, Como o soldado que rasgou a farda No desespero do último momento! Tenta chorar, e os olhos sente enxutos!... É como paralítico que, à míngua Da própria voz, e, na, que ardente o lavra, Febre de, em vão, falar, com os dedos brutos Para falar, puxa e repuxa a língua, E não lhe vem à boca uma palavra!