Manuela – (Cantiga do Rancho)

Castro Alves

Companheiros! já na serra Erra. A tropa inteira a pastar... Tropeiros! ... junto à candeia Eia! Soltemos nosso trovar ... Té que as barras do Oriente Rente Saiam dos montes de lá... Cada qual sua cantiga Diga Aos ecos do Sincorá. No rancho as noites se escoam. Voam, Quando geme o trovador... Ouvi, pois! que esta guitarra... Narra O meu romance de amor. ........................................... Manuela era formosa Rosa, Rosa aberta no sertão... Com seu torço adamascado Dado Ao sopro da viração. Provocante, mas esquiva, Viva Como um doudo beija-flor... Manuela - a moreninha Tinha Em cada peito um amor ... Inda agora quando o vento Lento Traz-me saudades de então Parece que a vejo ainda Linda Do fado no turbilhão Vejo-lhe o pé resvalando Brando No fandango a delirar. Inda ao som das castanholas Rolas Diante do meu olhar ... Manuela... mesmo agora Chora Minhalma Pensando em ti... E na viola relembro Lembro Tiranas que então gemi. "Manuela, Manuela Bela Como tu ninguém luziu... Minha travessa morena, Pena Pena tem de quem te viu!... Manuela... Eu não perjuro! Juro Pela luz dos olhos teus... Morrer por ti Manuela Bela, Se esqueces os sonhos meus. Por teus sombrios olhares - Mares Onde eu me afogo de amor... Pelas tranças que desatas - Matas Cheias de aroma e frescor ... Pelos peitos que entre rendas Vendas Com medo que os vão roubar... Pela perna que no frio Rio Pude outro dia enxergar ... Por tudo que tem a terra, Serra, Mato, rio, campo e céu... Eu te juro, Manuela, Bela Que serei cativo teu ... Tu bem sabes que Maria, Fria É pra outros, não pra mim... Que morrem Lúcia, Joana E Ana Aos sons do meu bandolim ... Mas tu és um passarinho - Ninho Fizeste no peito meu ... Eu sou a boca - és o canto Tanto Que sem ti não canto eu. Vamos pois A noite cresce Desce A lua a beijar a flor À sombra dos arvoredos Ledos Os ventos choram de amor Vamos pois ó moreninha Minha Minha esposa ali serás Ao vale a relva tapiza Pisa Serão teus Paços-reais! Por padre uma árvore vasta Basta! Por igreja - o azul do céu... Serão as brancas estrelas - Velas Acesas pra o himeneu". Assim nos tempos perdidos Idos Eu cantava mas em vão Manuela, que me ouvia, Ria, Casta flor da solidão! Companheiros! se inda agora Chora Minha viola a gemer, É porque um dia... Escutai-me Dai-me Sim! dai-me antes que beber!. . . É que um dia mas bebamos Vamos No copo afogue-se a dor! Manuela, Manuela, Bela, Fez-se amante do senhor!