Um Raio de Luar

Castro Alves

ALTA NOITE ele ergueu-se. Hirto, solene. Pegou na mão da moça. Olhou-a fito... Que fundo olhar! Ela estava gelada, como a garça Que a tormenta ensopou longe do ninho, No largo mar. Tomou-a no regaço... assim no manto Apanha a mãe a criancinha loura, Tenra a dormir. Apartou-lhe os cabelos sobre a testa... Pálida e fria... Era talvez a morte... Mas a sorrir. Pendeu-lhe sobre os lábios. Como treme No sono asa de pombo, assim tremia-lhe O ressonar. E como o beija-flor dentro do ovo, Ia-lhe o coração no níveo seio A titilar. Morta não era! Enquanto um rir convulso Contraíra as feições do homem silente — Riso fatal. Dir-se-ia que antes a quisera rija, Inteiriçada pela mão da noite Hirta, glacial! Um momento de bruços sobre o abismo, Ele, embalando-a, sobre o rio negro Mais sinclinou... Nesse instante o luar bateu-lhe em cheio, E um riso à flor dos lábios da criança À flux boiou! Qual o murzelo do penhasco à borda Empina-se e cravando as ferraduras Morde o escarcéu; Um calafrio percorreu-lhe os músculos... O vulto recuou!... A noite em meio Ia no céu!