Algumas Reflexões Sobre a Mulher

Eugénio de Andrade

Elas são as mães: rompem do inferno, furam a treva, arrastando os seus mantos na poeira das estrelas. Animais sonâmbulos, dormem nos rios, na raiz do pão. Na vulva sombria é onde fazem o lume: ali têm casa. Em segredo, escondem o latir lancinante dos seus cães. Nos olhos, o relâmpago negro do frio. Longamente bebem o silencio nas próprias mãos. O olhar desafia as aves: o seu voo é mais fundo. Sobre si se debruçam a escutar os passos do crepúsculo. Despem-se ao espelho para entrarem nas águas da sombra. É quando dançam que todos os caminhos levam ao mar. São elas que fabricam o mel, o aroma do luar, o branco da rosa. Quando o galo canta Desprendem-se para serem orvalho.