Pesadelo de Humaitá

Castro Alves

Poesia recitada no Rio de Janeiro. I Ao som dos rinchos dos cavalos bravos, Que soltos passam nos sertões remotos, Ao múrmur triste do cativo rio Que solta gritos sepulcrais, ignotos; Acorda um dia Humaitá sentindo Que a morte vibra-lhe o pesado arnês. Treme-lhe o manto dos gerais extensos, E o vil tirano se lhe agarra aos pés. II "Quem é que acorda a cidadela enorme Que a testa cinge de fatais ameias?" Brada arrogante do deserto a esposa, Sentindo o sangue lhe correr nas veias. "Dizei, condores, que voais do norte! Dizei, ó ventos, que do céu rompeis! Por que é que a brisa em seu broquei soluça E o vil tirano se me agarra aos pés?" III "Silêncio! Escuta! lhe responde trêmulo. Silêncio! diz-lhe do deserto a voz. Silêncio! É ele. . . — o Brasileiro Atlante, De um grande povo a legião feroz. Desceu dos Andes... da Bahia altiva... De Guanabara — esta mansão de reis... Treme, ó cidade!... Se o Brasil caminha O vil tirano se lhe agarra aos pés... IV Como o viajante da legenda Hebraica, Na terra imprime o gigantesco passo DÁtila monta no ginete fero... São-lhe as batalhas do caminho o traço Se pisa o Prata - Riachuelo brilha, Se estende o braço - Uruguaiana fez Oh! vibre o pulso o derradeiro golpe, E o vil tirano se lhe agarra aos pés". V Eis já no fumo os batalhões sentestam, Solto o estandarte no combate novo... Trincheiras, fortes, baluartes quebram-se, Ao férreo embate de um potente povo É um raio — a esquadra... As legiões retumbam, Ruge a refrega com seus mil tropéis... ... Bravo!... Vitória!... Viva o povo imenso, O vil tirano há de beijar-lhe os pés! VI Fere estes ares, estandarte invicto! Povo, abre o peito para nova vida! Talvez agora o pavilhão da pátria Açoite altivo Humaitá rendida. Sim! pela campa dos soldados mortos; Sim! pelo trono dos heróis, dos reis; Sim! peio berço dos futuros bravos, O vil tirano há de beijar-lhes os pés.