Pensamento de Amor

Castro Alves

Quero viver de esperança Quero tremer e sentir! Na tua trança cheirosa Quero sonhar e dormir. A. DE AZEVEDO. Ó PÁLIDA madona de meus sonhos, Doce filha dos cerros de Engadi!... Vem inspirar os cantos do poeta, Rosa branca da lira de Davi! Todo o amor que em meu peito repousava, Como o orvalho das noites ao relento, A teu seio elevou-se, como as névoas, Que se perdem no azul do firmamento. Aqui... além... mais longe, em toda a parte, Meu pensamento segue o passo teu. Tu és a minha luz, — sou tua sombra, Eu sou teu lago, — se tu és meu céu. Lá, no teatro, ao som das harmonias, Vendo-te a fronte altiva e peregrina... Eu apertava o seio murmurando — "Oh! mata-me de amor, mulher divina!" À tarde, quando chegas à janela, A trança solta, onde suspira o vento, Minha alma te contempla de joelhos... A teus pés vai gemer meu pensamento. Inda ontem, à noite, no piano Os dedos teus corriam no teclado; Que, às carícias destas mãos formosas, Gemia e suspirava apaixonado. Depois cantaste... e a ária suspirosa Veio nalma acender-me mais desejos; Dir-se-ia que essas notas eram doces Como sussurro de amorosos beijos. Oh! dizme, dizme, que ainda posso um dia De teus lábios beber o mel dos céus; Que eu te direi, mulher dos meus amores: — Amar-te ainda é melhor do que ser Deus!