O Livro e a América

Castro Alves

Ao Grêmio Literário Talhado para as grandezas, P'ra crescer, criar, subir, O Novo Mundo nos músculos Sente a seiva do porvir. — Estatuário de colossos — Cansado doutros esboços Disse um dia Jeová: "Vai, Colombo, abre a cortina "Da minha eterna oficina... "Tira a América de lá". Molhado inda do dilúvio, Qual Tritão descomunal, O continente desperta No concerto universal. Dos oceanos em tropa Um — traz-lhe as artes da Europa, outro — as bagas de Ceilão... E os Andes petrificados, Como braços levantados, Lhe apontam para a amplidão. (...) Por uma fatalidade Dessas que descem de além, O sec'lo, que viu Colombo, Viu Gutenberg também. Quando no tosco estaleiro Da Alemanha o velho obreiro A ave da imprensa gerou... O Genovês salta os mares... Busca um ninho entre os palmares E a pátria da imprensa achou... Por isso na impaciência Desta sede de saber, Como as aves do deserto — As almas buscam beber... Oh! Bendito o que semeia Livros... livros à mão cheia... E manda o povo pensar! O livro caindo n'alma É germe — que faz a palma, É chuva — que faz o mar. Vós, que o templo das idéias Largo — abris às multidões, P'ra o batismo luminoso Das grandes revoluções, Agora que o trem de ferro Acorda o tigre no cerro E espanta os caboclos nus, Fazei desse "rei dos ventos" — Ginete dos pensamentos, — Arauto da grande luz!... Bravo! a quem salva o futuro Fecundando a multidão!... Num poema amortalhada Nunca morre uma nação. Como Goethe moribundo Brada "Luz!" o Novo Mundo num brado de Briaréu... Luz! pois, no vale e na serra... Que, se a luz rola na terra, Deus colhe gênios no céu!... Bahia. Imagem - 00290001 Publicado no livro Espumas flutuantes: poesias de Castro Alves, estudante do quarto ano da Faculdade de Direito de S. Paulo (1870). In: ALVES, Castro. Obra completa. Org. e notas Eugênio Gomes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 198