A vã pergunta

Vinicius de Moraes

Esta jovem pensativa, de olhos cor de mel e de longas pestanas penumbrosas  Que está sentada junto àquele jovem triste de largos ombros e rosto magro  É ela a amada dele e é ele o amado dela e é a vida a sombra trágica dos seus gestos?  Este trem veloz cheio de homens indiferentes e mulheres cansadas e crianças dormindo  Que atravessa esta paisagem desolada de árvores esparsas em montes descarnados  É ele o movimento e é ela a fuga e são eles o destino fugitivo das coisas?  Que dizem os lábios murmurantes dele aos olhos desesperados dela?  Que pronunciam os lábios desesperados dela aos olhos lacrimejantes dele?  Que pedem os olhos lacrimejantes dele à paisagem fugindo?  Não são eles apenas uma só mocidade para o tempo e um só tempo para a eternidade?  Não são seus sonhos um só impulso para o amor e os seus suspiros um só anseio para a pureza?  Por que este transtorno de faces e esta consumição de olhares como para nunca mais?  Não é um casto beijo isso que bóia aos lábios dele como um excedimento da sua alma?  Não é uma carícia isso que freme nas mãos dela como um arroubo da sua inocência ?  Por que os sinos plangendo do fundo das consolações como as vozes de aviso dos faróis perdidos?  É bem o amor essa insatisfação das esperanças?