O prisioneiro

Vinicius de Moraes

Eu cerrei brandamente a janela sobre a noite quieta E fiquei sozinho e parado, longe de tudo. Nenhuma percepção — talvez uma leve sensação de frio no vento E uma vaga visão de objetos boiando no vácuo dos olhos. Nenhum movimento — distâncias infinitas em todas as coisas No lençol branco que era outrora o grande esquecimento No poeta que ontem era o refúgio e a lágrima E no misericordioso olhar de luz que sempre fora o supremo apelo. Nenhum caminho — nem a possibilidade de um gesto desalentado Na angústia de não ferir o desespero do espaço imóvel. Passariam as horas e nas horas o auge de cada instante de sofrimento Passariam as horas até a hora de voltar para o amor das almas E seguir com elas até a próxima noite. Nenhum movimento — é preciso não despertar o sono dos que velam em espírito É preciso esquecer que há poesia a ser colhida nas longas estradas. Nenhum pensamento — a mobilidade será o horror de todas as noites É preciso ser feliz na imobilidade. ---