Na esperança de teus olhos

Vinicius de Moraes

Rio de Janeiro Eu ouvi no meu silêncio o prenúncio de teus passos  Penetrando lentamente as solidões da minha espera  E tu eras, Coisa Linda, me chegando dos espaços  Como a vinda impressentida de uma nova primavera.  Vinhas cheia de alegria, coroada de guirlandas  Com sorrisos onde havia burburinhos de água clara  Cada gesto que fazias semeava uma esperança  E existiam mil estrelas nos olhares que me davas.  Ai de mim, eu pus-me a amar-te, pus-me a amar-te mais ainda  Porque a vida no meu peito se fizera num deserto  E tu apenas me sorrias, me sorrias, Coisa Linda  Como a fonte inacessível que de súbito está perto.  Pelas rútilas ameias do teu riso entreaberto  Fui subindo, fui subindo no desejo de teus olhos  E o que vi era tão lindo, tão alegre, tão desperto  Que do alburno do meu tronco despontaram folhas novas.  Eu te juro, Coisa Linda: vi nascer a madrugada  Entre os bordos delicados de tuas pálpebras meninas  E perdi-me em plena noite, luminosa e espiralada  Ao cair no negro vórtice letal de tuas retinas.  E é por isso que eu te peço: resta um pouco em minha vida  Que meus deuses estão mortos, minhas musas estão findas  E de ti eu só quisera fosses minha primavera  E só espero, Coisa Linda, dar-te muitas coisas lindas...