Namorados no mirante *

Vinicius de Moraes

Rio de Janeiro Eles eram mais antigos que o silêncio  A perscrutar-se intimamente os sonhos  Tal como duas súbitas estátuas  Em que apenas o olhar restasse humano.  Qualquer toque, por certo, desfaria  Os seus corpos sem tempo em pura cinza.  Remontavam às origens - a realidade  Neles se fez, de substância, imagem.  Dela a face era fria, a que o desejo  Como um hictus, houvesse adormecido  Dele apenas restava o eterno grito  Da espécie - tudo mais tinha morrido.  Caíam lentamente na voragem  Como duas estrelas que gravitam  Juntas para, depois, num grande abraço  Rolarem pelo espaço e se perderem  Transformadas no magma incandescente  Que milênios mais tarde explode em amor  E da matéria reproduz o tempo  Nas galáxias da vida no infinito.  Eles eram mais antigos que o silêncio...  * Feito para uma fotografia de Luís Carlos Barreto.