Menino morto pelas ladeiras de Ouro Preto

Vinicius de Moraes

Hoje a pátina do tempo cobre também o céu de outono  Para o teu enterro de anjinho, menino morto  Menino morto pelas ladeiras de Ouro Preto.  Berçam-te o sono essas velhas pedras por onde se esforça  Teu caixãozinho trêmulo, aberto em branco e rosa.  Nem rosas para o teu sono, menino morto  Menino morto pelas ladeiras de Ouro Preto.  Nem rosas para colorir teu rosto de cera  Tuas mãozinhas em prece, teu cabelo louro cortado rente...  Abre bem teus olhos opacos, menino morto  Menino morto pelas ladeiras de Ouro Preto.  Acima de ti o céu é antigo, não te compreende.  Mas logo terás, no Cemitério das Mercês-de-Cima  Caramujos e gongolos da terra para brincar como gostavas  Nos baldios do velho córrego, menino morto  Menino morto pelas ladeiras de Ouro Preto.  Ah, pequenino cadáver a mirar o tempo  Que doçura a tua; como saíste do meu peito  Para esta negra tarde a chover cinzas...  Que miséria a tua, menino morto  Que pobrinhos os garotos que te acompanham  Empunhando flores do mato pelas ladeiras de Ouro Preto...  Que vazio restou o mundo com a tua ausência...  Que silentes as casas... que desesperado o crepúsculo  A desfolhar as primeiras pétalas de treva...