Compadre
Você morreu
Você morreu de sua morte simples e dolorosa
Sonda na barriga
(Minha comadre que me perdoe de lembrar essas coisas)
Vômitos, e mais sonda na bexiga
E mais sonda barriga e mais vômitos
De vez em quando uma voltinha até o Veloso
Para tomar umas e outras.
Meu compadre querido, companheiro de tantas angústias
Dois ou três dois depois de você Hemingway morreu
Hemingway que gostava de touradas
Que gostava de caçar leões na África
Que gostava de tudo o que um homem que não é homem não gosta.
Meu compadrinho, você que foi tão macho diante da morte
Você que morreu de seu diabetes feito um homem que morre
Meu compadre
Que diferença entre a sua morte e a morte de Hemingway
Hemingway que sempre quis ser o bacano
Que gostava de ver homens matar touros
(E que isto que eu estou dizendo sirva de qualquer coisa para meu amigo
João Cabral de Melo)
Hemingway que não tinha medo de avião e gostava de matar bichos na África
E você no entanto, meu compadre Carlos Echenique
Uma semana antes da sua morte
Andou providenciando para a Iracema
Minha querida Iracema, flor negra do meu Brasil
Minha outrora empregada, atualmente empregada de Rubem Braga
Iracema que queria tanto um salão para alisar o cabelo de crioula
De cabelo de crioula feito o seu, minha boa Iracema
Minha irmãzinha de cor, de cor muito mais bonita que a de Hemingway
Iracema, crioula do Brasil, figura mais anti-Hemingway que o meu próprio compadre Carlos Echenique
Que morreu de seu diabetes, e na hora que deram oxigênio para ele
Disse ai que arzinho tão bom, e cuja morte tão direita
Não tern nada a ver com a morte bacana de Hemingway, muito pelo contrário
Cuja morte tem a ver com meu amigo Jayme Ovalle, na fotografia tirada por meus primos os irmãos Franceschi
E com a canção de João Gilberto, e o violão de Baden Powell, e a tristeza de Antonio Carlos Jobim
E o sacrificio de santa Luzia que tinha olhos tão lindos que os sacrificou à luxúria dos homens numa pequena salva de estanho.