Soneto sentimental à cidade de São Paulo

Vinicius de Moraes

Ó cidade tão lírica e tão fria!  Mercenária, que importa - basta! - importa  Que à noite, quando te repousas morta  Lenta e cruel te envolve uma agonia  Não te amo à luz plácida do dia  Amo-te quando a neblina te transporta  Nesse momento, amante, abres-me a porta  E eu te possuo nua e fugidia.  Sinto como a tua íris fosforeja  Entre um poema, um riso e uma cerveja  E que mal há se o lar onde se espera  Traz saudade de alguma Baviera  Se a poesia é tua, e em cada mesa  Há um pecador morrendo de beleza?