JESUÍTAS

Castro Alves

(século XIII) Ó mês frères, je viens vous apporter mon Dieu, Je viens vous apporter ma tête! V. Hugo (Châtiments) Quando o vento da Fé soprava Europa, Como o tufão, que impele ao ar a tropa Das águias, que pousavam no alcantil; Do zimbório de Roma — a ventania O bando dos Apostlos sacudia Aos cerros do Brasil. Tempos idos! Extintos luzimentos! O pó da catequese aos quatro ventos Revoava nos céus... Floria após na India, ou na Tartária, No Mississipi, no Peru, na Arábia Uma palmeira — Deus! — O navio maltês, do Lácio a vela, A lusa nau, as quinas de Castela, Do Holandês a galé Levava sem saber ao mundo inteiro Os vândalos sublimes do cordeiro, Os átilas da fé. Onde ia aquela nau? — Ao Oriente. A outra? — Ao pólo. A outra? — Ao ocidente. Outra? — Ao norte. Outra? — Ao sul. E o que buscava? A foca além no pólo; O âmbar, o cravo no indiano solo, Mulheres em Stambul. Ouro — na Austrália; pedras — em Misora!. . "Mentira!" respondia em voz canora O filho de Jesus... "Pescadores!... nós vamos no mar fundo "Pescar almas pra o Cristo em todo mundo, "Com um anzol — a cruz —!" Homens de ferro! Mal na vaga fria Colombo ou Gama um trilho descobria Do mar nos escarcéus, Um padre atravessava os equadores, Dizendo: "Gênios!... sois os batedores Da matilha de Deus." Depois as solidões surpresas viam Esses homens inermes, que surgiam Pela primeira vez. E a onça recuando sesgueirava Julgando o crucifixo... alguma clava Invencível talvez! O martírio, o deserto, o cardo, o espinho, A pedra, a serpe do sertão maninho, A fome, o frio, a dor, Os insetos, os rios, as lianas, Chuvas, miasmas, setas e savanas, Horror e mais horror ... Nada turbava aquelas frontes calmas, Nada curvava aquelas grandes almas Voltadas pra amplidão... No entanto eles só tinham na jornada Por couraça — a sotaina esfarrapada... E uma cruz — por bordão. Um dia a taba do Tupi selvagem Tocava alarma... embaixo da folhagem Rangera estranho pé... O caboclo da rede ao chão saltava, A seta ervada o arco recurvava... Estrugia o boré. E o tacape brandindo, a tribo fera De um tigre ou de um jaguar ficava à espera Com gesto ameaçador... Surgia então no meio do terreiro O padre calmo, santo, sobranceiro, O Piaga do amor. Quantas vezes então sobre a fogueira, Aos estalos sombrios da madeira, Entre o fumo e a luz... A voz do mártir murmurava ungida "Irmãos! Eu vim trazer-vos — minha vida... Vim trazer-vos — Jesus!" Grandes homens! Apóstolos heróicos!... Eles diziam mais do que os estóicos: "Dor, — tu és um prazer! "Grelha, — és um leito! Brasa, — és uma gema! Cravo, — és um cetro! Chama, — um diadema Ó morte, — és o viver!" Outras vezes no eterno itinerário O sol, que vira um dia no Calvário Do Cristo a santa cruz, Enfiava de vir achar nos Andes A mesma cruz, abrindo os braços grandes Aos índios rubros, nus. Eram eles que o verbo do Messias Pregavam desde o vale às serranias, Do pólo ao Equador... E o Niagara ia contar aos mares... E o Chimborazo arremessava aos ares O nome do Senhor!...