A ponte de Van Gogh

Vinicius de Moraes

Itatiaia O lugar não importa: pode ser o Japão, a Holanda, a campina inglesa.  Mas é absolutamente preciso que seja domingo.  O azul do céu ecoa na esmeralda do rio  E o rio reflete docemente as margens de relva verde-laranja  Dir-se-ia que da mansão da esquerda voou o lençol virginal de miss  Para ser no céu sem mancha a única nuvem.  A calma é velha, de uma velhice sem pátina  As cores são simples, ingênuas  A estação é feliz: o guarda da ponte chegou a pintar  De listas vermelhas o teto de sua casinhola.  E, meu Deus, se não fossem esses diabinhos de pinheiros a fazer caretas  E a pressa com que o homem da charrete vai:  - A pressa de quem atravessou um vago perigo  Tudo estivesse perfeito, e não me viesse esse medo tolo de a pequena ponte levadiça  Desabe e se molhe o vestido preto de Cristina Georgina Rosseti  Que vai de umbrela especialmente para ouvir a prédica do novo pastor da vila.   Itatiaia, 1937.