Amigo Di Cavalcanti…

Vinicius de Moraes

São Paulo, nos 66 anos do pintor mais jovem do Brasil Amigo Di Cavalcanti  A hora é grave e  inconstante.  Tudo aquilo que prezamos  O povo, a arte, a cultura  Vemos sendo desfigurado  Pelos homens do passado  Que por terror ao futuro  Optaram pela tortura.  Poeta Di Cavalcanti  Nossas coisas bem-amadas  Neste mesmo exato instante  Estão sendo desfiguradas.  Hay que luchar, Cavalcanti  Como diria Neruda.  Por isso, pinta, pintor  Pinta, pinta, pinta, pinta  Pinta o ódio e pinta o amor  Com o sangue de tua tinta  Pinta as mulheres de cor  Na sua desgraça distinta  Pinta o fruto e pinta a flor  Pinta tudo que não minta  Pinta o riso e pinta a dor  Pinta sem abstracionismo  Pinta a Vida, pintador  No teu mágico realismo!  Carioca Di Cavalcanti:  Na rua do Riachuelo  Nasceste, a 6 de setembro  Do ano noventa e sete.  Infante, foste criado  No bairro de São Cristóvão  Na chácara do avô materno  Emiliano Rosa de Senna  (Nome de avô de pintor!)  Orgulhoso proprietário  Do antigo morro do Pinto  (Quem sabe não vem de herança  O teu amor às mulatas?)  Logo os bairros se renovam:  Botafogo, Glória (hotel)  Copacabana e Catete  (O Catete de onde nunca  Deverias ter saído  E ao qual agora voltaste  Humilde e reconhecido).  Moraste no hotel Central  E no hotel dos Estrangeiros:  Ambos desaparecidos  E onde à tarde, entre os amigos  Tomavas, e com que gosto  O melhor uísque do mundo!  Paquetá, um céu profundo  Que não sabe onde acabar  Viu-te muito passear  Ó genial vagabundo!  - Quantas vezes foste à Europa  Dize-me, grão-vagamundo?  No ano de trinta e oito  Em Paris te descobri  Rimos e bebemos muito  Nos bares de por ali  Lembras-te, Di? Consue-  Lo de Saint-Exupéry  Saía sempre conosco  E mais o sargento Thyrso  Que uma noite lá, por pouco  Não sai no braço comigo.  Como foste meu irmão!  Como eu fiquei teu amigo!  E no México, te lembras?  Com Neruda e com Siqueiros  E a linda Maria Asúnsolo  Que tenia blanco el pelo  Bebemos tanta tequilla  Que até dava gosto ver-nos  A comer com gulodice  Um prato de tacos pleno!  Mais de setecentas luas  Ungiram tua cabeça  Que hoje é branca como a Lua  Mas continua travessa...  Que bom existas, pintor  Enamorado das ruas  Que bom vivas, que bom sejas  Que bom lutes e construas:  Poeta o mais carioca  Pintor o mais brasileiro  Entidade a mais dileta  Do meu Rio de Janeiro  - Perdão, meu irmão poeta:  Nosso Rio de Janeiro! nos 66 anos do pintor mais jovem do Brasil