Soneto da hora final

Vinicius de Moraes

Será assim, amiga: um certo dia Estando nós a contemplar o poente Sentiremos no rosto, de repente O beijo leve de uma aragem fria. Tu me olharás silenciosamente E eu te olharei também, com nostalgia E partiremos, tontos de poesia Para a porta de treva aberta em frente. Ao transpor as fronteiras do Segredo Eu, calmo, te direi: — Não tenhas medo E tu, tranquila, me dirás: — Sê forte. E como dois antigos namorados Noturnamente triste e enlaçados Nós entraremos nos jardins da morte. Montevidéu, julho de 1960