Balada para Maria

Vinicius de Moraes

Não sei o que me angustia Tardiamente; em meu peito Vive dormindo perfeito O sono dessa agonia... Saudades tuas, Maria? Na volúpia de uma flora Úmida, pecaminosa Nasceu a primeira rosa Fria... Perdi o prazer da hora. Mas se num momento cresce O sangue, e me engrossa a veia Maria, que coisa feia! Todo o meu corpo estremece... E dos colmos altos, ricos Em resinas odorantes Pressinto o coito dos micos E o amor das cobras possantes. No mundo há tantos amantes... Maria... Cantar-te-ei brasileiro: Maria, sou teu escravo! A rosa é a mulher do cravo... Dá-me o beijo derradeiro? — Cobrir-te-ei de pomada Do pólen das flores puras E te fecundarei deitada Num chão de frutas maduras Maria... e morangos, quantos! E tu que adoras morango! Dormirás sobre agapantos... — Fingirei de orangotango! Não queres mesmo, Maria? No lombo morno dos gatos Aprendi muita carícia... Para fazer-te a delícia Só terei gestos exatos. E não bastasse, Maria... E morro nessas montanhas Entre as imagens castanhas Da tua melancolia...